Venezuela: Deus e o diabo nas terras do petróleo

Venezuela: Deus e o diabo nas terras do petróleo

Imagem do Autor por Guilherme Tetamanti
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A bandeira da Venezuela tem três listras horizontais. O amarelo simbolizando as riquezas do território venezuelano, o azul o mar que separa o país da Espanha, que foi o país colonizador, e o vermelho, o sangue derramado pelos que lutaram pela independência. Hoje, só o azul se mantém como verdadeiro, límpido e transparente nas ilhas paradisíacas de Los Roques.

A Venezuela é hoje o país com mais reservas de petróleo do mundo com estimados 513 bilhões de barris de petróleo, cuja extração demanda custos estruturais impossíveis de suportar na atual conjuntura político-econômica. O sangue derramado é o das 11 vítimas diárias de assassinato que tornam Caracas, com exceção de outras cidades situadas em áreas de guerra, a cidade mais violenta do mundo.

Em homenagem a Simón Bolívar, Hugo Chávez acrescentou a oitava estrela à bandeira e para atender a um capricho da filha, o cavalo que no brasão do país corria para a esquerda, agora corre para a direita.

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Desembestadamente

Em duas matérias, a Venezuela de Caracas onde o povo passa fome, adoece, é sequestrado e assassinato num clima de total insegurança; e uma outra Venezuela, a das ilhas paradisíacas de Los Roques, a jóia da coroa do Caribe.

 

A Venezuela agoniza em cima de bilhões de barris de petróleo

Você assistiu à famosa série de televisão “Lost”, ou leu “The Lost World” de Michel Crichton? Pois é, as duas obras foram inspiradas no livro do escocês Conan Doyle (ele mesmo, o criador de Sherlock Holmes), “O Mundo Perdido”, publicado em 1912 cuja ação decorre na tríplice fronteira entre Brasil, Venezuela e Guiana, onde, no romance, ainda viviam dinossauros, homens macaco e outras criaturas extintas.

Ao desembarcar no Maiquetía Simón Bolívar Aeropuerto Internacional de Caracas, situado a 26 quilômetros do centro da cidade, a estranha sensação, ao percorrer os longos corredores ladeados por lojas desocupadas, é a de que, mesmo sem dinossauros, ou homens macacos, eu estava chegando a um cenário surreal semelhante ao de Doyle onde tudo é possível e pode acontecer.

Mesmo sem conhecer ninguém em Caracas, logo na saída na ala de desembarque, você será rodeado por centenas de pessoas, sorridentes e solícitas. São cambistas querendo trocar os seus dólares por bolívares venezuelanos oferecendo preços absurdos. Se você aceitar negociar com eles, além de estar cometendo uma ilegalidade, ainda correrá o risco de ficar com uma mochila cheia de bolívares falsos. Uma mochila cheia? Sim!

 

Dinheiro .. para que tanto dinheiro?

Caracas, na Venezuela
Imagem: The Photographer, via Wikimedia Commons.

No câmbio oficial para cada 100 dólares você receberá 995 bolívares fortes venezuelanos (VEF). No câmbio negro ou paralelo, por 100 dólares eu recebi VEF 190.598,00. Imagine essa quantia em notas de 100, 50, 20, 10, 5 e 2  bolívares!! Fiquei com a mochila cheia mas, pelo menos, eram verdadeiros.

Uma dica: leve notas de dólares americanos de valor baixo para não ter que andar com bolos de dinheiro e sofrer um assalto, ou escondê-los no seu quarto de hotel e vê-los desaparecer. Não confie nos cofres disponíveis nos hotéis. Nestes dias tumultuados, até o gerente do banco poderá ser um informante para grupos de sequestros. Falaremos disso adiante.

Está difícil entender essa loucura? Concordo, não é fácil mas é algo que você precisa aprender rapidinho porque poderá significar toda a diferença entre comprar um sorvete pelo equivalente a 1 ou 500 dólares.

Casas de câmbio também não são confiáveis, saques em máquinas 24 horas também não existem, cartões de crédito, débito, cheques de viagem, completamente inviáveis à conta da conversão.

De uma maneira geral os comerciantes são honestos, você poderá fazer câmbios com eles quando fizer alguma compra. O melhor de tudo, caso não tenha familiares ou amigos que possam ajudar nessa “missão”, é antes de viajar contatar algum guia venezuelano que estará a sua espera no aeroporto para fazer a recepção. Eu conheci alguns de quem tirei informações e posso sugerir como pessoas confiáveis e acima de suspeitas (deixe um comentário abaixo, caso preciso de indicações).

 

Como ir do aeroporto de Caracas ao hotel

O Aeroporto de Caracas fica a 26 quilômetros do centro da cidade. Ou você combina o preço da corrida antecipadamente, ou terá uma surpresa, já que taxímetros são objetos inúteis e desconhecidos. Já em Caracas, jamais apanhe um táxi circulando, prefira sempre um táxi com ponto ou peça na recepção do hotel para chamar. Para uma corrida de aproximadamente 30 minutos, o taxista cobrará USD 1.

Escolha hospedar-se em hotéis de grandes redes internacionais como o Gran Melia, JW Marriott ou Renaissance, a um custo de USD 190/USD 250. Embora apresentem um aspecto exterior com fachadas deterioradas, pelo menos sabonetes, toalhas e papel higiênico estarão disponíveis num país onde tudo falta. E mais do que isso, os restaurantes desses complexos hoteleiros estão sempre bem abastecidos, com qualidade de serviços e de higiene que se tornaram raros em Caracas, não apenas pela escassez de produtos de primeira necessidade e de limpeza, como também a crise no abastecimento de água. Numa semana é comum a falta de água durante três dias.

Isso constatei em alguns restaurantes em La Castellana, Chacao e mesmo na Estação Altamira, que é considerado um bairro de classe média alta, com péssimas condições de higiene (banheiros entupidos, moscas e baratas pelas paredes). Alguns proprietários, para economizar nos salários, chamam os funcionários da limpeza pública para fazer a faxina nos seus estabelecimentos.

Muitas pizzarias fecharam porque surgem os movimentos que fazem protestos por estas utilizarem fornos a lenha de madeira ilegalmente derrubada. Os clientes assustados, desapareceram e os donos fecharam as portas. Há alguns restaurantes, de propriedade de narcotraficantes, onde se paga por uma “paella” USD 160, certamente com excelente qualidade de serviço, mas não vale a pena o risco de você sentir-se transportado para uma das cenas antológicas do “Poderoso Chefão” e assistir a um tiroteio entre gangues rivais.

 

Sequestros com hora marcada

As noites em Caracas tornaram-se extremamente perigosas com as ruas mal iluminadas. Na cidade mais violenta do mundo, o terror dos sequestros, seguidos de assassinatos, é visível na população já que qualquer um pode ser o próximo alvo. Todos se recolhem cedo, embora as estatísticas informem que a hora de maior incidência de sequestros acontece sempre ao amanhecer: de domingo até quarta-feira.

A polícia é a mais eficiente informante para os sequestradores, seguida de funcionários de hotéis, garçons de restaurantes, caixas de bancos e a empregada doméstica. Os sequestrados podem ser turistas, empresários, funcionários públicos, trabalhadores do comércio, estudantes. Em setembro, ume equipe inteira de futebol, os Trujillanos, foi sequestrada e ficou na mão dos bandidos durante 48 horas.

Qualquer sinal exterior de riqueza exibido, como um celular para tirar uma foto, é o suficiente. Um colega meu, radialista, tem a certeza absoluta de que nada ainda lhe aconteceu por andar vestido como um mendigo e trazer no pulso um relógio de plástico. Meninos, com idade entre 12 e 14 anos, chamados de “cocos secos” (“nada na cabeça”) são assassinos em potencial. Armados, deslocam-se em motocicletas de baixa cilindrada, assaltam os pedestres e atiram para matar.

As motocicletas de grande calibragem pertencem a serviços de segurança pessoal ou comercial que, desde que contratados, fazem uma pessoa em Caracas sentir-se como se circulasse em Zurique, na Suiça. E custam muito caro, algo em torno de USD 50 por hora.

 

O que ver em Caracas?

Empresas internacionais como a Gray Line e a City Discovery, apesar da insegurança, mantém as suas excursões diárias para os turistas que queiram conhecer Caracas. A um custo entre USD 30 a USD 60 por pessoa, visita-se o local onde nasceu Simón Bolívar, o Museo Bolivariano, a Galeria de Arte Nacional, a Quinta de Anauco, o Teatro Municipal, Museo de Ciencias Naturales e o Museo de los Ninos. As visitas são rápidas, as paradas poucas e os ônibus são escoltados por seguranças em motocicletas.

O teleférico leva o turista ao alto do Cerro El Ávila, que a 1500 metros é o ponto mais alto da cidade. Não esqueça o casaco, faz sempre muito frio.

A 30 quilômetros de Caracas e por USD 40, vale a pena conhecer El Hatillo, uma cidade em estilo colonial com suas casas pitorescas e coloridas, onde se pode comprar lindas peças de artesanato

No final de semana de 11 e 12 de novembro de 2016, aconteceu a terceira das conferências entre governo e oposição. Mediada pelo Vaticano e pela União das Nações Sul Americanas (UNASUL), foram discutidos aspectos para uma trégua que melhore a economia e a segurança do país. A derradeira reunião acontecerá em 6 de dezembro e será, sem dúvida, a última oportunidade de uma negociação que ponha fim ao descalabro do governo populista de Nicolás Maduro.

O povo venezuelano assim espera e merece.

Obs: Não foram tiradas fotos, seguindo orientação expressa.

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Guilherme Tetamanti

Paulistano de 40 anos e muita história pra contar. Amo e odeio a selva de pedra, e por isso faço de tudo pra viajar. Sou empresário, administrador de empresas e criador de algumas lojas virtuais. Vendi tudo em 2011 para realizar o sonho de fazer uma viagem de volta ao mundo e praticar fotografia, uma de minhas paixões. Sempre fugi das aulas de redação, mas a vontade de viajar, fazer novas amizades e compartilhar minhas andanças, me motivaram a criar o Quero Viajar Mais.

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